52 anos de saudades
Cantor Paulo Queiroz, o Paulito de Cosmópolis
Texto Adriano da Rocha
Fotos Nivaldo Otavani e discoteca Acervo Cosmopolense
COSMÓPOLIS, DEZEMBRO DE 1965
Formando nuvens de poeira na SP-332, na época uma estradinha de terra que parecia uma “colcha de buracos”, um possante cadillac aproximava-se de Cosmópolis.
O “ronco” do possante motor, anunciava sua vinda ao cruzar a velha ponte sobre o Rio Pirapitingui. O pujante barulho, atraia a curiosidade da colonada do Batata, que abria as icônicas janelas azuis das casas e saia no terreiro da colônia. Admirada, a colonada observava fascinada o gigantesco automóvel descendo a Rua João Aranha.
Entre as ruas Campinas e Ramos de Azevedo, o magnifico automóvel estacionava para abastecer no Posto de combustíveis da família Andretto. O cadillac bicolor, nas cores branco e verde claro, contrastava em sua funilaria, o tom vermelho do chão da Rua Campinas, ainda sem asfalto.
Dois homens desciam do carro, chamando o proprietário, o mais novo sem perguntar o preço, cordialmente falava:
“Está aqui as chaves. Pode encher o tanque, o restante do dinheiro fica para o senhor. Quando terminar o abastecimento, pode colocar ao lado da Alfaiataria do Zuza Nallin. No campinho de futebol mesmo, a molecada não vai reclamar”.
O proprietário ganhava o dia, quase uma bomba inteira, só para encher o tanque do cadillac.
ILUSTRES VISITANTES
Teddy Vieira, um dos maiores compositores da histórica musical brasileira. Amigo de Paulo Queiroz, e um dos responsáveis artísticos da gravadora Chantecler./ Foto Adriano da Rocha |
Os homens subiam a Rua Campinas, muito bem vestidos, acompanhando as tendências americanas da moda. Usavam termos espojados, camisas de colarinho largo, gravata fininha, calças bem cortadas, e sapatos bicolor (branco e preto), reluzentes no tom escuro, mas já cobertos de poeira vermelha.
Próximo a alfaiataria Nallin, os homens batiam palma em uma das primeiras casas construídas em Cosmópolis. Na verdade, a primeira casa de um conjunto de construções, ondem residiam as famílias Toledo Silva, Nabão e Queiroz.
Um jovem atendia, era o padeirinho Horácio de Queiroz, espantado olhando em uma fresta na porta, perguntava quem é??
“Sou eu, o Paulito!! Estou com o Teddy, trouxe umas lembrancinhas aos parentes”.
O jovem contente chamava os pais, avós, tios e irmãos, que orgulhosos chegavam de encontro ao ilustre parente. A criançada já corria para chamar a parentada, saindo das poucas casas próximas, na maioria, residências de uma mesma família.
Sobre o portão feito de madeira trançada, estavam dois dos maiores compositores da história musical brasileira. Sendo um deles, orgulhosamente, com raízes infindas em Cosmópolis. Paulito, era Paulo de Queiroz, com seu amigo Teddy Vieira.
Teddy, consagrado compositor, instrumentista e diretor artístico, criador de sucessos como Menino da Porteira, Boiadeiro Errante, Rei do Gado, Dona Felicidade, Couro de Boi, Pagode em Brasília, entre inúmeros outros grandes sucessos. Considerado na época, o compositor sertanejo mais bem sucedido do gênero musical popular.
O jovem Paulito, como era conhecido pelos familiares e amigos, conquistou fama com suas composições e versões de sucessos internacionais. Não esquecendo da marcante voz grave, tom único, que lhe destacava como crooner, cantor de todos os ritmos e estilos.
Das suas versões, quem não se lembra da canção “Dominique”,gravação belga da freira Soeur Sourire (Irmã Sorriso). Na tradução de Paulo, a canção recebia uma versão exclusiva, gravada e imortalizada nacionalmente na voz de Giane.
“Dominique, nique, nique
Sempre alegre esperando alguém
Que possa amar
O seu príncipe encantado
Seu eterno namorado
Que não cansa de esperar”
Sempre alegre esperando alguém
Que possa amar
O seu príncipe encantado
Seu eterno namorado
Que não cansa de esperar”
O SENHOR DOS SUCESSOS
Dominique foi apenas um dos sucessos, os quais Paulo fez versões, o jovem era conhecido no meio artístico como o “Senhor dos sucessos”.
Dominique foi apenas um dos sucessos, os quais Paulo fez versões, o jovem era conhecido no meio artístico como o “Senhor dos sucessos”.
Compositor e versionista preferido de astros do disco, como Agnaldo Rayol, Hebe Camargo, Claudia Moreno, Léu Romano, Rubens Peniche, Edith Veiga, entre inúmeros artistas consagrados da época.
Giane diziam ser sua cantora predileta, não era por menos. Em 15 dias do lançamento de Dominique, em dezembro de 1963, a versão de Paulo de Queiroz alcançava todas as paradas de sucesso nacional. O pequeno disco 78rpm, tornava-se a música mais executada no Brasil, ultrapassando 3 milhões de copias vendidas em menos de um mês
AS RAÍZES COSMOPOLENSES
Início dos anos de 1940- Casa de Luiz Manuel de Queiroz na Rua Campinas. Uma das várias casas onde residiam ,na mesma rua, os familiares de Paulo Queiroz / Foto Acervo Cosmopolense |
Paulo de Queiroz, tinha raízes em Cosmópolis, assim como uma infinidade de parentes. Nasceu em Espirito Santo do Pinhal, quando na década de 1920, sua família partia de Cosmópolis para a famosa terra do café.
Na histórica cidade dos barões, a família Queiroz trabalharia na administração e beneficiamento do café, sendo reconhecidos na região pelo distinto serviço nas fazendas.
Orgulhosos cosmopolenses, garantiam que seus primeiros acordes ao violão (era um exímio músico), foram dedilhados nas sombras dos flamboyants da velha Igreja Matriz de Santa Gertrudes.
Segundo seus “conterrâneos”, a bucólica Cosmópolis, era seu berço de descanso e serenatas, quando passava férias na casa de parentes.
Suas primeiras palavras em italiano, idioma que fez inúmeras versões de sucessos brasileiros, o jovem aprendeu com a colonada da Usina Esther. Garantia uma saudosa colona do Ranchão.
As canções da França, com certeza foi o velho Luiz Lefloc, imigrante francês, quem ensinou o jovem Paulito. Assim, inúmeras “estórias” e “causos”, sempre marcavam o ilustre “conterrâneo” à pequena Cosmópolis.
Na verdade, os idiomas italiano, francês, inglês e espanhol, Paulo aprendeu quando estudava em Campinas, e nos renomados colégios de Pinhal. O dom musical, este a pessoa nasce com tal predileção, os estudos somente aperfeiçoam o talento. Como foi o caso de Paulo.
DIVULGAÇÃO E ÚLTIMA VISITA
"Nosso Presente de Natal", ultima gravação feita por Paulo de Queiroz, compacto gravado em dueto com Giane. Um dos compactos mais vendidos da gravadora no fim dos anos de 1960. |
A breve e rápida passagem de Paulo e Teddy, naquela manhã de 1965, acontecia pelo lançamento do compacto “Nosso presente de Natal”. Gravado por Giane em dueto com Paulo Queiroz.
O pequeno disco, trazia quatro imortais sucessos natalinos, Natal branco (White Christmas), música de Irving Berlin, com versão de Paulo Queiróz, Noite feliz (Franz Gruber - Pe. J.F.Mohr), Boas festas (Assis Valente) eFeliz Natal (Klecius Caldas - Armando Cavalcanti).
Ao lado de Teddy, o jovem compositor fazia a divulgação do compacto nas emissoras da região. Na ocasião, os compositores voltavam de Campinas, seguindo para as cidades de Limeira e Piracicaba, onde o disco seria entregue nas rádios e serviços de alto falantes.
Teddy, era um dos responsáveis artísticos da gravadora Chantecler, a famosa gravadora do galinho, realizando com Paulo, a divulgação do recente trabalho do cantor.
Aos familiares, deixou alguns compactos e chaveiros da gravadora (com o brasão do galinho de Barcelos). Antes da partida para Limeira, uma rápida passagem no serviço de alto falantes “A Voz de Cosmópolis”, localizado na Praça do Coreto.
A voz do jardim, a lendária Modestina, recebia dos compositores o compacto autografado, o qual durante anos ficou exposto em seu bar na Rua Ramos de Azevedo esquina com Otto Herbet.
A saudade da querida Cosmópolis, fazia o cantor ter a breve paragem, seria o último adeus a terra de sua infância.
A MORTE NA RAPOSO TAVARES
Edição do Diário da Noite, de 17 de dezembro de 1965, trazendo com destaque a tragédia que vitimou sete vidas. Foto Acervo do historiador caipira Nivaldo Otavani
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Em 16 de dezembro de 1965, dias depois da breve visita cosmopolense, um acidente vitimava os amigos Paulo e Teddy Vieira.
Na Rodovia Raposo Tavares, em Buri, cidade vizinha de Itapetininga, o Simca de Teddy capotava. O carro tentava fazer uma ultrapassagem, ao invadir a outra via, o veículo perdia o controle, capotando várias vezes. O jornal paulistano, Diário da Noite, destacava sua capa com impactantes fotos, trazendo a manchete: “Morte na contra mão a 120 km por hora!”
O quilômetro 139 da Raposo Tavares, marcava tragicamente as mortes dos sete ocupantes do veículo. Morriam Teddy Vieira, Paulo Queiroz, o cantor Lauripes Pedroso (da dupla Irmãos Divino) e sua filha, Antônio Pedroso e esposa Jandira (pai e mãe do cantor), e o Tenente Manoel Farao. Paulo Queiroz estava com 28 anos de idade.
Os amigos viajavam à Buri, para passar as festas de Natal e ano novo. Familiares de Teddy, nascido na região, aguardavam os amigos para festejar, pescar e caçar na cidade. O trágico acidente comovia o Brasil inteiro, o governador Adhemar de Barros decretava luto oficial no estado de São Paulo.
A morte ceifava a vida dos corpos, porém nunca a vida artística dos amigos, imortais como seus nomes e trabalhos musicais.
Feliz Natal , e paulistamente falando: Boas janeiras de começo de ano.
Que possamos ter o progresso como palavra principal em 2018. Que seja um ano de progresso em todos os sentidos e setores de nossas vidas.
Abaixo uma seleção especial de sucessos de Paulo Queiroz
Abaixo uma seleção especial de sucessos de Paulo Queiroz
"Natal branco". Versão brasileira de Paulo Queiroz, cantada em dueto com Giane.
Paulo Queiroz - Orquestra e Coro Chantecler, sob a regência de Francisco Moraes - ANGELITA (Angelita di Anzio) - Romano - Minerbi - versão de Paulo Queiroz.
Disco Chantecler C-336051 - Angelita - Saudade em Prelúdio - Paulo Queiroz.
Texto Adriano da Rocha
Fotos Nivaldo Otavani e discoteca Acervo Cosmopolense