A derradeira colônia cosmopolense, fora de Cosmópolis
O intenso tom vermelho nos tijolos à vista, portas e janelas pintadas em um azul único, telhados baixos, pequenos jardins indicando a divisão das casas unidas por paredes.
Demarcando as modestas moradias, cercas de bambu e ripas, uma porteira feita de dois troncos de madeira. Flamboyants, sibipirunas, entre outras árvores plantados em uma extensa fileira.
Traços marcantes da Colônia do Sobrado Velho, último conjunto de casas coloniais existente na região. Edificações reminiscentes do maior complexo colonial do estado de São Paulo, construídas pela Usina Esther no início do século passado.
Localizada em território pertencente a cidade de Americana (SP), a Colônia está há 8 quilômetros distante de Cosmópolis. Seguindo o mesmo processo que extinguiu as colônias cosmopolenses, a Sobrado Velho somente não foi demolida graças a união dos moradores de Americana.
120 ANOS DE HISTÓRIA CANAVIEIRA
Caminhos estreitos, entre barracos e muita cana, seguem para Americana na centenária estradinha canavieira. O chão é de terra batida, cascalhada e até bem cuidada, sinal que as colheitadeiras e caminhões de cana transitam sempre na estrada.
Um gigantesco Flamboyant marca o principal acesso as casas, suas raízes saltam do chão. Em seus frondosos galhos um balanço, feito com cordas e um pneu usado. Duas tábuas de peroba usam as raízes como base, é um banco improvisado, com certeza feito por amigos, onde na sobra da árvore “matutam” conversas infindas sobre a vida.
Quem viu nos últimos anos a demolição de mais de 200 casas, colônias do Bota Fogo, Quebra Canela, Saltinho, Cooperativa, e até mesmo o lendário Sobrado dos patrões, ficará emocionado ao ver essas casinhas.
As casas seguem o projeto colonial de 1898, elabora pelo renomado escritório de Arquitetura e Engenharia Ramos de Azevedo. A construção é simples, casa de colono não tem luxo, todas as edificações seguem a mesma concepção e material.
Os tijolos são todos aparentes, grandes e vermelhos, feitos de terra “massapé”, na mesma olaria que edificou a Usina Esther e a primeira Igreja Matriz de Santa Gertrudes.
Nas janelas e portas um marcante destaque das coloninhas, tijolos assentados na transversal, um charme na modesta construção. No alto dos telhados, entre as telhas portuguesas, gigantescas antenas parabólicas, trazem um pouco de modernidade ao isolado lugar.
O quintal é imenso, existindo em algumas casas velhos poços d’água (a maioria inutilizado), plantações de hortaliças, legumes, pequenos parreiras de uva e figo, e é claro as icônicas jabuticabeiras.
As pesadas portas e janelas, lavradas em madeira de lei (peroba rosa, jacarandá paulista e pinho), conservam o mesmo tom azul claro. A cor padrão das construções na época áurea da Usina, hoje a cor é o símbolo da saudade entre os colonos.
Na entrada das casas muitas plantas e pequenas árvores, sempre ao gosto de cada morador. Em cada casa um capricho diferente no pequeno jardim, formado entre a rua de terra batida e o calçamento das casas.
Espalham-se pelo chão e seguem crescendo subindo sem destino, flores como craveiras, roseiras, orquídeas do mato, cosmo laranja (popular flor do mato), crista de galo, entre uma infinidade de espécies e aromas, que desabrocham e perfumam todo ambiente.
Será que sonhei demais, viajei nas lembranças ao escrever esse relato?! Não, com extrema felicidade pode garantir, as palavras descrevem perfeitamente esse “paraíso” perdido.
Você que não é nascido aqui, neste chão cosmopolense pode até dizer: “Mano, você exagerou chamar isso de paraíso”.
Mas amigo de outras terras, pode ter certeza, quem aqui nasceu ao ver essas imagens a palavra exata será paraíso.
As lembranças marcantes vividas nestas modestas casinhas, transformam a derradeira colônia, em um local ainda mais perfeito que qualquer outro paraíso do mundo.
Relatei com o olhar da alma, descrito pelo coração, e como diria um colono: “Tudo é igual como antes, o “disgranhento” “progresso” ainda não passou por lá “.
Texto Adriano da Rocha
Música:
Bachianinha nº 1
Interprete e autor
Paulinho Nogueira
(Campinas, 8/10/1927 — São Paulo, 02/ 08/ 2003)
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