MEMÓRIA
#TBT- Ainda ontem em Cosmópolis...
OLHAR NA FOTO
25 de fevereiro - Casa das máquinas da Usina Ester |
Em muitas seções da Usina, complexo industrial e colônias, os
acessos somente eram possíveis através de barcos. Nas imagens históricas, quem
segue na poita do barco é o jovem Hidelbrando Bernacchi, o popular Brandão da
Papelaria, então funcionário do setor elétrico da Usina Ester.
Segundo Brandão, nascido e criado na Fazenda Usina Ester, nunca havia acontecido
uma enchente com tamanha intensidade, “em poucas horas, as águas dos rios
invadiram tudo”, declarou ao Acervo em 2011.
25 de fevereiro - Em destaque no barco, próximo da Casa das Máquinas, o jovem Brandão Bernacchi |
NOITE DAS ÁGUAS, AMANHECER DAS LÁGRIMAS
25/02/1970 - Sobraram somente as vigas da "Ponte do Poção", submersas pelas águas do Jaguari |
O ano de 1929 ficou marcado como a primeira grande enchente
registrada em Cosmópolis, ocasionando na destruição de partes do Paredão. A “enchente de 25 de fevereiro de 1970”, superava
todos os dados e marcas do passado.
Registros dos dias 22, 23 e 24 de fevereiro
22/02 - Marcas das águas na Ponte Azul, a edificação foi levada pelo intenso fluxo do rio na madruga de 25/02. |
22/02 - “Chuva, chuva, chuva, não quer mais parar de chover. Parece que iremos voltar à 1929, nunca choveu tanto assim em Cosmópolis, a cana cresceu nas últimas horas um palmo, vamos ter safra de oito meses.
Às 13 horas do dia 22, o Sr. Ebeling dá ordens para aprontar
todas as talhas existentes na Usina Ester, e prepara-las para o pior. Em caso
de perigo vamos usá-las para levantar as máquinas da Casa de Força”.
Dia 23/ 02 - “A pinguela sobre o rio Pirapitingui não resistiu mais. O rio subiu 70 cm em menos de quatro horas, e outra forte pancada de água à cair. Vai mesmo voltar à 1929, precisamos prever o impossível, mas já provável.
Às 14h30min o senhor Maia chega à Usina pedindo apressadamente cordas e câmaras
de ar para salvar um homem que caiu da ponte do Pirapitingui” (...).
Outros incidentes
de auxilio foram registrados durante a semana, deixando em prontidão as equipes
de salvamento.
Ponte sobre o Rio Jaguari em duas fases
Estiagem de novembro de 1969 - Ponte sobre o Rio Jaguari, acesso as colônias da Granja Foto Dorival Batista de Moraes |
23 de fevereiro de 1970 - Ponte sobre o Rio Jaguari, um dia antes da destruição pelas águas Foto Dorival Batista de Moraes |
O jipe , um dos veículos especiais da Usina Ester, era a única condução adequada para transitar nas vias cobertas de lama, ocasionados pelos desmoronamentos em vários pontos de Cosmópolis.
“Às 15h30min horas. O senhor José Toledo vem correndo da Represa, dizendo para providenciar imediatamente pessoas com ferramentas e sacos vazios para fazer uma barragem lá. O paredão corria o risco de desmoronar totalmente” (...).
Os grandes sacos de açúcar, confeccionados de algodão e juta, eram
cheios de areia e costurados, criando barragens para impedir o avanço das águas.
“Gente trabalhando em todos os lados, quando chega notícias
da casa de força, faltava menos de 1.60 metros para a água invadir o salão das
máquinas. A situação está perigosa” (...).
“Às 19h. Está escuro mais os serviços na ponte continuam. Na
casa de forças faltam 1.40 para a água entrar. O senhor Ebeling dá a seguinte
ordem: “no momento em que faltar 1 metro vamos parar os geradores e iniciar os
trabalhos para levantar as máquinas. Chamou o senhor Carlos Capraro e informou
a respeito, ele deve comparecer com todos os carpinteiros. O Dr. Paulo Neto foi
até a represa e ficou impressionado, faltavam menos de 1,26 metros para às
águas invadirem a casa de força.” (...).
A cidade amanhecia em pânico, com inúmeros pontos de alagamentos, casas invadidas e assoladas pelas águas do Ribeirão Três Barras, Baguá. Desmoronamentos das encostas do Morro Castanho, impediam os tráfegos na estrada para Limeira e Artur Nogueira. As casas da “Colônia do matadouro”, localizada na região do CRTC (Centro de Referência do Trabalhador de Cosmópolis), estavam parcialmente cobertas pelas águas do Baguá, inúmeras construções próximas do rio tombaram. A recém construída ponte do matadouro, região da atual fábrica dos refrigerantes Furlan, era destruída pela força das águas.
O fluxo das águas derrubavam três pontes sobres os rios Jaguari e Pirapitingui,
deixando ilhada a Fazenda Usina Ester. Centenas de colonos, principalmente da
Granja e Saltinho, ficavam reclusos.
O jornal semanário ACP (União impressa de Artur Nogueira,
Cosmópolis e Paulínia), noticiava duas mortes por afogamento naquela fatídica madrugada.
Eram dois operários da Refinaria do Planalto (Replan), ambos migrantes da Bahia
contratados pela Petrobras, residentes em uma moradia coletiva na região do
bairro Cascata, próximo do Rio Pirapitingui.
Um sitiante tentando atravessar a ponte sobre o Rio Pirapitingui,
parcialmente submersa, foi arrastado pelas correntezas. O homem sobreviveu, o
cavalo morreu nas águas do rio, sendo encontrado o animal preso aos destroços da
carroça.
A ponte, então localizada na velha Estrada de Campinas (atual
SP-332- Professor Zeferino Vaz), era o único acesso ao município de Cosmópolis.
Devido ao estado de calamidade total, o então prefeito Bube
Neumann e proprietários da Usina Ester, José Bonifácio Coutinho Nogueira exercia
o cargo de Secretário de Meio Ambiente (atual função de Ministro), acionavam o auxílio
emergencial das forças do exército.
Na época, a central de comandos do Exército ficava em
Paulínia, então decretada cidade de segurança nacional, devido as obras da
Petrobras. Uma força tarefa do exército, composta por soldados e engenheiros, chegavam
na tarde do dia 26/02.
A cidade inteira unia-se em auxílio da Fazenda Usina Ester e
seus moradores, assim como aos residentes da região do Baguá, assolados pelas
águas, criando um dos maiores grupos de apoio humanitário da história
cosmopolense.
“Até Deus sensibilizou do povo cosmopolense, a chuva cessou,
surgindo um sol extremamente forte nos dias seguintes, secando rapidamente o
lamaçal criado pelas águas. Os rios abaixavam vagarosamente, possibilitando os
acessos à Usina e Cosmópolis.
Onde as águas passavam, em uma cor marrom intensa, marca da terra vermelha, deixavam rastros de destruição.
As pontes, projetadas por
habilidosos construtores, foram destruídas como um jogo de dominó, uma levando
à outra. Foram dias de muito lamento, tristeza realmente, porém, dias marcados
pela união de todos. Um fato ainda mais marcante, marco dos cosmopolenses, foi o
auxilio e amor ao próximo”, declarou Dr. Paulo Nogueira Netto (memória), sobre
a grande enchente de 1970, em entrevista ao Jornal de Paulínia em 2015.
2013 - Destroços da antiga barragem do Paredão no Rio Pirapitingui, a força das águas foi tamanha que destruiu a casa de força e parte da estrutura do paredão |
“Como esquecer fevereiro de 1970, o dia 25 e os dias anteriores!! Nasci em Cosmópolis, meus pais e avôs aqui viram nascer essa cidade, nunca havia acontecido uma situação como tal. Superou 1929, transformando a grande enchente em garoa. Choveu demais, choveu muito, sem parar e forte.
Não fosse a união de todos, muitas pessoas morreriam. Fomos rápidos, e prevíamos o pior. As colônias próximas do Jaguari e Pirapitingui, houve casas levadas pelas águas, as paredes velhas de barro, pareciam pedaços de bolos desfarelando.
Os bombeiros da Usina salvaram muitas pessoas, gente que tentava atravessar, e que era levada pelas águas. Vi crianças sendo puxadas pelos valorosos bombeiros da usina. Deus teve piedade de nós, misericórdia, ouvindo nossas preces”, relatou Leonel Rodrigues (memória), ex-vereador e então funcionário da direção da Usina Ester, em nota de 2001 ao Acervo Cosmopolense.
No dia 02 de abril, uma quinta-feira, o Monsenhor João
Batista Maria Rigotti, realizou uma missa e procissão em ação de graças pelos
livramentos ao povo cosmopolense, reunindo centenas de pessoas na região
central. A união dos moradores e trabalhadores da Usina Ester, evitou uma
tragédia maior, assim como auxiliou os aflitos prejudicados pela “Noite das
águas”.